quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Perfil na web de supostas policiais faz apologia à morte de criminosos

A Ordem dos Advogados do Brasil vai oficiar as polícias do Distrito Federal para apurar o possível envolvimento de membros das corporações com postagens que fazem apologia à morte de criminosos e xingam quem critica servidores da segurança pública. As mensagens foram enviadas por meio do perfil "Polícia Feminina" em uma rede social. De setembro do ano passado a fevereiro deste ano a conta fez 192 publicações e angariou 5.848 seguidores.

“O fato de o perfil ser particular não torna o fato menos gravoso, pois ele, ao que parece, propõe-se a trazer a público condutas violentas de policiais sob uma capa de deboche, o que coloca as respectivas corporações na berlinda”.

Entre as imagens postadas estão a de uma policial militar usando óculos escuros e apontando a arma, com a legenda "Câmera para bandido. Olha e espera o flash", e a de uma civil de costas, usando colete, acompanhada do texto "Não importa como e aonde. Iremos ao combate, iremos te achar. Por que para nós bandido bom é aquele a sete palmos da terra (sic)". Outras postagens criticam mulheres que postaram fotos com ofensas a PMs, chamando-as de "marmitinha de bandido", "verme" e "aborto malsucedido".

O G1 procurou a administração da página, que disse ainda não ter um posicionamento sobre a situação. Depois da publicação, a responsável disse que vai retirar as imagens que disseminam a violência contra criminosos.

"O intuito da página é de mostrar o dia a dia das mulheres no trabalho militar. O intuito da página nunca foi à apologia de morte de bandidos. Se postei, foi por motivo dos usuários pedirem para publicar, para as pessoas saberem que a maioria das pessoas tarja a corporação como corrupta e suja. Ninguém sabe o que se passa na vida dessas pessoas, as condições de trabalho e o que eles passam para defender a nossa sociedade. Gostaria de ter reconhecimento por estar mostrando o trabalho dessas milhares de mulheres que largam tudo em prol da paz e de uma sociedade melhor. Gostaria de pedir publicamente desculpas a todas as corporações se estou sujando o nome das mesmas", afirmou.

As fotos, segundo as publicações, pertenceriam a policiais de todas as áreas – Civil, Militar, Federal e Rodoviária Federal – e de diversos estados. Em uma montagem divulgada há cinco meses, a responsável por administrar o perfil reuniu os brasões das PMs do DF, São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Bahia, Amazonas, Pernambuco, Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Santa Catarina, Rondônia e Espírito Santo.

Por e-mail, a Polícia Civil do DF disse não ter reconhecido a participação de mulheres da corporação nos posts e disse que a formação do quadro "é pautada no respeito e defesa aos direitos individuais e coletivos". A PM do DF afirmou que a conta "claramente não pertence a nenhuma instituição policial militar" e que não pode responder por ofensas feitas em um perfil particular. A Polícia Rodoviária também declarou que o perfil não é institucional. "A Corregedoria da PRF se pauta na legalidade e não corrobora com qualquer atitude de seus agentes que venha a desrespeitar a legislação vigente." O G1 também procurou a polícia Federal, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

A vice-presidente da Comissão dos Direitos Humanos da OAB, Indira Quaresma, criticou a existência da conta. "[A prática] Não é tolerável em nenhuma circunstância, mas principalmente quando se trata de agentes de segurança pública. O fato de o perfil ser particular não torna o fato menos gravoso, pois ele, ao que parece, propõe-se a trazer a público condutas violentas de policiais sob uma capa de deboche, o que coloca as respectivas corporações na berlinda."

Segundo a advogada, a ordem vai aguardar a resposta dos comandos das polícias do DF sobre as investigações para adotar outras medidas. Indira disse ainda que não estão descartados cursos de atualização que tratem sobre o respeito a suspeitos de crimes.

O presidente do Sindicato dos Policiais Civis do DF, Rodrigo Franco, afirmou à reportagem que a categoria rejeita a postura disseminada por meio do perfil. "Não coaduno com esse tipo de postura. Os policiais civis de Brasília não coadunam com esse comportamento", declarou. "Não conheço nenhuma policial daqui que tenha a ver com isso."

Especialista em segurança pública, a doutora em ciências sociais Cristina Zackseski analisou algumas publicações a pedido do G1. Entre as situações identificadas pela professora estão à depreciação da imagem da polícia combinada com vulgaridade, a falta de perfil e de compreensão do que é o trabalho policial e o uso dos símbolos das corporações como forma de reforçar o corporativismo.

"O discurso de rigor contra o crime como sendo o que falta para vencer a luta contra o crime foi e é alimentado por muitos anos por uma política criminal autoritária, que não é exclusividade dos períodos autoritários, mas que sobrevive em várias práticas do sistema de controle formal. A pessoa que posta se serve de uma lógica segundo a qual aqueles que se dizem cidadãos de bem vão aplaudir quando alguém é ou promete ser 'enérgico' contra o crime, ainda que essa energia seja criminosa, pois a leitura do senso comum é a de que o crime sempre está mais forte do que 'nós' e que por isso precisa de um enfrentamento violento", afirma. (Redação e foto: G1)

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